Vicente Moreira de Freitas em 14 de julho de 1857 na cidade de Curitiba, filho de Mathildes. Assim como a mãe, foi escravo de José Moreira de Freitas, de quem adotou o sobrenome. Em 17 de junho de 1884, aos 27 anos de idade, conquistou sua alforria, por meio do Fundo de Emancipação, um dispositivo criado pela Lei de 28 de Setembro de 1971 (Lei do Ventre Livre), que era destinado à compra de alforria de escravos que estivessem de acordo com os critérios estabelecidos no regulamento da lei, publicado em 1872.
Ainda escravo, no ano de 1883, casou-se e constituiu família com Olympia d’Assumpção (após o casamento, Olympia Maria de Freitas), natural de Morretes, filha de Maria Rosa. O casal, que residiu na Rua Saldanha Marinho, espaço central de Curitiba, teve sete filhos: Antonia, Leonídia, Palmyra, Maria, Vicentina, Vicente Junior e Mário.
Desde quando vivia como escravizado, Vicente exercia o ofício de pedreiro, junto aos demais escravos que acompanhavam José Moreira de Freitas, seu senhor, que era mestre de obras de Curitiba.
No ano de 1888, Vicente se encontrava junto a outros oito homens negros que fundaram o Clube 13 de Maio, espaço de sociabilidade e auxílio à comunidade negra em Curitiba. Apesar de não assinar como sócio fundador, sua importância nesse momento e nos anos seguintes é clara, chegando a assumir os cargos de Presidente, Tesoureiro e Presidente do Conselho Fiscal do clube por diversas vezes. A participação na vida associativa da cidade não parava por aí: Vicente atuou também na Irmandade de São Benedito, e assumiu cargos de diretoria na Sociedade Operária e Beneficente Protetora dos Operários, que congregava trabalhadores da capital. Sua participação nos mais variados círculos associativos da cidade lhe renderam reconhecimento público, chegando a ser referenciado nos jornais como um “leader trabalhista” local.
Também a família Moreira de Freitas é mais uma expressão de continuidade familiar da tradição associativa e pode ser que essa sociabilidade tenha sido o primeiro passo na formação da família: quando Vicente foi mesário da festa da Irmandade de São Benedito no ano de 1889, Olympia detinha o cargo de rainha, sendo a participação na Irmandade um lugar comum aos dois. Além disso, Olympia e filhos participavam dos mesmos clubes e sociedades que Vicente, e tiveram presença significativa em tais espaços. Mario Moreira de Freitas, por exemplo, aparece ligado à figura de liderança do pai, e além de integrar a Sociedade Protetora dos Operários e a “13 de Maio” tomou a frente também de diversos outros clubes sociais e carnavalescos. Palmyra também acompanhou os passos dos pais e participou ativamente da “Protetora”, inclusive proferindo discursos em datas comemorativas. No ano de 1909, Vicente e Olympia requerem e ganham o título de sócios beneméritos da “Protetora”. Leonídia, uma das outras filhas, foi presidente no importante Grêmio das Camélias, grupo de mulheres que se formou internamente ao Clube 13 de Maio. (sobre a relação da família com o associativismo, ver Entrevista com India Maria Freitas Fabre).
Em 1896, junto a outros companheiros do Clube 13 de Maio, Vicente tentou inserir-se política legislativa municipal, concorrendo para suplente do cargo de camarista na Câmara de Curitiba. Ainda que tenha recebido poucos votos, é significativo que Vicente e outros ex-escravizados tenham tentado ocupar um espaço na política institucionalizada.
Vicente Moreira de Freitas faleceu vítima de uma enfermidade na bexiga no dia 7 de abril de 1926, aos 69 anos. Olympia faleceu em 1934, oito anos após a morte do marido. A memória de Vicente e sua esposa continuou a ser resgatada por seus descendentes até hoje, principalmente por parte daqueles que ainda carregam o sobrenome Moreira de Freitas.
Retrato da lápide de Vicente Moreira de Freitas no Cemitério Municipal de Curitiba, cedida pela pesquisadora Clarissa Grassi.
verbete elaborado por Carolina Marchesin Moisés – Universidade Federal do Paraná – mestranda
janeiro 2020
Refêrencias
Bibliografia
FABRIS, Pamela B.; HOSHINO, Thiago. Sociedade Operária Beneficente 13 de Maio: Mobilização negra e contestação política no pós-abolição. In: MENDONÇA, Joseli M. N.; SOUZA, Jhonatan U. Paraná insurgente: História e lutas sociais – séculos XVIII ao XXI. São Leopoldo: Casa Leiria, 2018. pp. 51-64.
FREITAS, Nei Luiz Moreira de. Celebração do 13 de Maio: subsídios para elaboração de uma proposta de registro de patrimônio cultural imaterial. Trabalho de Conclusão de Curso ( Bacharelado em História, Memória e Imagem), Universidade Federal do Paraná. 2018.
MENDONÇA, Joseli M. N.; FABRIS, Pamela B. Freitas e Brito: trajetória de uma família negra na Curitiba do final do século XIX e início do XX. In: MENDONÇA, Joseli M. N.; MAMIGONIAN, Beatriz G. e TEIXEIRA, Luana (orgs.). Pós-Abolição no Sul do Brasil: associativismo e trajetórias negras. Salvador: Sagga, 2020.
Fontes
Registros civis e paroquiais disponíveis no site FamilySearch <https://www.familysearch.org/pt/>.
Periódicos disponíveis no site da Hemeroteca Digital Brasileira <http://bndigital.bn.br/hemeroteca-digital/>.