Trajano Margarida nasceu em Florianópolis, quando a cidade denominava-se Desterro, em 16 de Janeiro de 1889. As informações sobre seus ascendentes são escassas, mas referências feitas em seus poemas permitem saber que sua avó Geralda, foi escrava. No fim dos anos 1910, começou a lecionar, trabalhando em Florianópolis, Itajaí e Brusque. Casou-se com Mamede Luz em 1913 e no ano seguinte batizou seu único filho, Nelson. Em 1917, ingressou no serviço público, tendo sido nomeado servente da extinta Secretaria Geral do Estado e no ano seguinte passou a trabalhar como amanuense na Secretaria do Interior e da Justiça de Santa Catarina. Permaneceu no serviço público por três décadas, tendo se aposentado em 1941.

Trajano Margarida tornou-se poeta nos anos 1910, quando começou a publicar em jornais da capital catarinense. Era músico, tocava violão e cantava, o que o fez figura muito popular na cidade, tendo se destacado especialmente na organização de blocos e cordões carnavalescos. Foi um dos principais compositores de marchinhas no carnaval de Florianópolis nos anos 1930. Publicou cerca de 12 livros de poesia. A maioria reunia sonetos de temática social e crônicas cotidianas sobre a cidade, além de temas religiosos, políticos e alguns poemas românticos. Também publicou longos poemas, como “A fome e a sede no Ceará”, “A Pátria e o Sorteado” e obras temáticas como “Nelson”, dedicado ao filho falecido no início dos anos 1940. Publicava frequentemente nos principais jornais da capital e nos anos 1930 manteve por alguns períodos uma coluna nos jornais Dia e Noite e a Gazeta denominada “Três por Dia” em que, em versos, tratava dos acontecimentos rotineiros da cidade e criticava comportamentos políticos e sociais citando nominalmente as pessoas. Em razão dos escritos nessa coluna foi suspenso do trabalho mais de uma vez.

Em 1914, Trajano Margarida uniu-se a Ildefonso Juvenal e Agrícola Guimarães para organizar as comemorações da Abolição da Escravidão na data de 13 de Maio. A reunião de jovens negros alfabetizados, envolvidos em atividades laborais diversas e que viviam no centro da cidade, ou próximo a ele, gerou frutos. Em 1920, eles fundaram em Florianópolis o Centro Cívico e Recreativo José Boiteux, do qual Trajano Margarida foi o primeiro presidente, elegendo-se novamente para o cargo em 1924, quando a associação havia passado a se chamar Centro Cívico e Recreativo Cruz e Sousa. Dentre os objetivos do Centro estava o de realizar uma campanha para erguer um monumento em homenagem a Cruz e Sousa. Tendo sido bem sucedida, a herma para o poeta negro foi inaugurada em 1923 em uma solenidade que reuniu a comunidade negra da cidade, autoridades diversas e população em geral, marcando um momento público de discursos antirracistas.

Trajano Margarida participou do grupo fundador do Figueirense Futebol Clube, em 1921, no qual tomou posse como Primeiro Secretário, e para o qual escreveu seu hino. Era alinhado às ideias do Partido Republicano Catarinense, associando-se à Junta Republicana, em 1922. Um dos raros momentos em que dedicou sua caneta a textos político-partidários ocorreu em 1929, quando escreveu uma “carta aberta aos homens de cor” convocando-os a votar em Julio Prestes no pleito presidencial.

Ao longo de sua vida permaneceu fortemente articulado aos grupos literários da capital catarinense, sendo protagonista nos debates que opuseram intelectuais filhos das classes mais abastadas a outros grupos (negros, mulheres, trabalhadores) que buscavam ocupar espaços na cena cultural catarinense nos anos 1920. Como conseqüência, em 1925, esteve entre os fundadores do Centro Catarinense de Letras, entidade que buscava ser mais democrática que a Academia Catarinense de Letras.

Em 1929, foi promovido a primeiro oficial da Diretoria de Interior e Justiça. Faleceu em 1946, vitimado por uma insuficiência cardiocirculatória.

Dentre suas principais obras, contam:

O Natal do orfãozinho ou o presente de Jesus. Florianópolis: Typographia a Eletricidade da Livraria Moderna, 1914.

Pátria: poemeto patriótico. Florianópolis: Officina Gráfica da Phenix, 1917.

A fome e a sede no Ceará. Poesia. Florianópolis: Typographia da Livraria Central, 1919.

Minha terra: commemorando a inauguração da Ponte Hercílio Luz e rendendo uma pálida homenagem a seu grande idealizador. Florianópolis: Ed. do autor, 1926.

Carnaval. Florianópolis, Typ. Schuldt, 1930.

Brack. Poemeto. Florianópolis, edição do autor, 1936.

Paz. Florianópolis: Imprensa Oficial, 1936.

Nelson. Sonetos. Florianópolis, Estabelecimentos Gráficos Brasil, Ltda, 1943.

Verbete escrito por Luana Teixeira. Universidade Federal de Santa Catarina. Fevereiro de 2020.

 

 

Bibliografia

Carta aberta aos homens de cor da minha terra, meus irmãos de raça. A República, Florianópolis, ano 3, numero, 868(A), domingo, 01.09.29, p. 4.

GARCIA, Fábio. Negras Pretensões: A presença de intelectuais, músicos e poetas negros nos jornais de Florianópolis e Tijucas no início do século XX. Florianópolis: Editora Umbutu, 2007.

MATTOS, Felipe. Armazém da Província: vida literária e sociabilidades intelectuais em Florianópolis na Primeira República. Tese (Doutorado em História), Universidade Federal de Santa Catarina, 2014.

PEREIRA, Lucésia. Florianópolis, década de trinta: ruas, rimas e desencantos na poesia de Trajano Margarida. Dissertação (Mestrado em História), Universidade Federal de Santa Catarina, 2001.

RASCKE, Karla Leandro. Intelectuais Negros: escritos de Trajano Margarida em Florianópolis (1915-1946). In: Anais do VI SEREM: seminário educação, relações raciais e multiculturalismo. Florianópolis, UDESC, v. 1, p. 354–366, 2017.

TEIXEIRA, Luana. A herma e a imagem: Cruz e Sousa e os homens de letras na Florianópolis nos anos 1920. In: Anais 9º Encontro Escravidão e Liberdade no Brasil Meridional, Florianópolis, 2019.

TEIXEIRA, Luana; PEREIRA, Lucésia. Trajano Margarida: poeta do povo. Florianópolis: Cruz e Sousa, 2019. https://afrosul.com.br/wp-content/uploads/2020/02/livro_TrajanoMargaridaPoetadoPovo.pdf